
Brasil acaba de sancionar uma lei pioneira em proteção digital para crianças e adolescentes..
O Brasil agora tem uma norma inovadora voltada à proteção de menores no ambiente digital. Conhecido como ECA Digital, o Projeto de Lei 2628/2022 foi sancionado em 17 de setembro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Agora transformado na Lei Federal 15.211/2025, o texto é a primeira legislação no mundo a proibir que plataformas analisem o comportamento de crianças e adolescentes para segmentar anúncios publicitários — prática central no modelo de negócios das big techs.
Com 16 capítulos e 41 artigos, o texto restringe a monetização de conteúdos que explorem ou hiperssexualizem menores e exige que plataformas digitais, como redes sociais e jogos, implementem sistemas de verificação etária. Também prevê configurações padrão mais protetivas, ferramentas de supervisão parental e relatórios semestrais de transparência sobre riscos e medidas de mitigação.
Para Yasmin Curzi, advogada e professora da Fundação Getulio Vargas (FGV) Rio, trata-se de um marco regulatório. “A nova lei vai finalmente estabelecer deveres de prevenção, de informação e de segurança para as empresas que fornecem produtos e serviços digitais”, afirma.
Um ponto inédito no mundo
O Reino Unido e a Austrália já aprovaram legislações de proteção a adolescentes na internet. No entanto, o diferencial brasileiro é a vedação expressa ao perfilamento de menores — o rastreamento de comportamento para publicidade segmentada. De acordo com Rafael Zanatta, codiretor da Data Privacy Brasil, isso representa uma “vitória monumental”. “Nenhum país havia implementado essa vedação de forma expressa, nem mesmo a União Europeia com o DSA. O artigo que proíbe o perfilamento de crianças e adolescentes rompe com um modelo de negócios baseado na coleta e exploração massiva de dados comportamentais”, explica.
Desafios práticos
A lei também exige que plataformas com provável acesso de menores adotem sistemas confiáveis de identificação etária, certificados pelo poder público. Esse ponto, no entanto, gera preocupação. Experiências semelhantes no Reino Unido aumentaram o uso de VPNs, e na Austrália ainda há indefinição sobre o tipo de tecnologia a ser empregada. No Brasil, embora o texto proíba que os dados usados para verificação sejam reaproveitados para outros fins (em linha com a LGPD), especialistas alertam para riscos de vazamento e de exclusão digital de famílias com menor acesso à documentação adequada.
Outro destaque é a obrigatoriedade de transparência: plataformas com mais de um milhão de usuários deverão publicar relatórios semestrais, em português, detalhando notificações recebidas, denúncias, ações de moderação e medidas de proteção à privacidade infantil.
Games, supervisão parental e riscos de concentração
O impacto será grande no setor de games. Jogos populares entre crianças e adolescentes, como Roblox e Fortnite, terão de eliminar as chamadas loot boxes, caixas de recompensas pagas com prêmios aleatórios. “As empresas terão que repensar o desenho de seus produtos. Quem não se adequar corre o risco de enfrentar processos no Brasil ou até de retirar serviços do país”, alerta Zanatta.
A lei também prevê novas obrigações de supervisão parental. Redes sociais deverão disponibilizar ferramentas acessíveis e eficazes para que pais e responsáveis monitorem a experiência online dos adolescentes.
A sanção, porém, veio acompanhada de vetos. Lula retirou do texto a atribuição da Anatel como responsável por cumprir ordens de bloqueio, definindo que a questão será tratada por decreto. Também vetou a destinação imediata de multas ao Fundo da Criança, respeitando prazos da LDO, e reduziu de um ano para seis meses o prazo de vigência, via medida provisória. Todos os vetos ainda dependem de análise pelo Congresso, que poderá mantê-los ou derrubá-los.
Texto: Redação TI Rio