A inteligência artificial (IA) deixou de ser uma promessa distante para se tornar prioridade absoluta no presente das empresas brasileiras. Um estudo recente da consultoria Bain & Company revelou que 67% das organizações do país já colocam a IA entre suas cinco principais prioridades estratégicas em 2025, uma guinada expressiva em relação ao ano anterior. Mais que tendência, a IA se tornou condição de permanência no mercado.

A pesquisa aponta que a adoção efetiva da tecnologia mais que dobrou em apenas um ano, saltando de 12% em 2024 para 25% das empresas com uso ativo de IA. O impacto vai além da estatística: companhias que implementaram soluções baseadas em IA generativa, capazes de produzir textos, imagens, códigos e análises, reportaram ganhos médios de 14% em produtividade. Muitas delas também apresentaram desempenho financeiro acima da média de seus respectivos setores.
Esse avanço, no entanto, expõe uma contradição estrutural: a velocidade da transformação supera a capacidade do país de formar talentos na mesma proporção. A escassez de profissionais qualificados virou gargalo para a continuidade do crescimento tecnológico. Segundo a Brasscom, o Brasil forma anualmente menos de 60% da demanda por especialistas em tecnologia, e apenas uma fração desses estão preparados para lidar com IA generativa, machine learning ou engenharia de dados em escala.
Nesse cenário, a cooperação entre empresas deixou de ser uma vantagem estratégica e passou a ser uma questão de sobrevivência competitiva. Em vez de atuar isoladamente, corporações passaram a formar consórcios, joint ventures e hubs de inovação, unindo forças para compartilhar talentos, infraestrutura, dados e soluções. É o caso da parceria entre Qualcomm e Nvidia, que vêm desenvolvendo juntas tecnologias voltadas para data centers com IA embarcada, uma combinação de hardware de ponta e inteligência algorítmica de alto desempenho.

No setor financeiro, grandes bancos têm buscado startups especializadas em IA para acelerar o desenvolvimento de assistentes inteligentes, automatizar canais de atendimento e reforçar a segurança digital. Essas colaborações evitam a duplicação de esforços em áreas críticas como compliance regulatório e segurança cibernética, ao mesmo tempo em que ampliam a velocidade de inovação.
“A IA é estratégica, mas exige velocidade. Parcerias são, hoje, uma questão de urgência operacional”, afirmou um diretor de inovação de uma das instituições envolvidas.
O desafio da formação de mão de obra tem levado também a ações articuladas com o setor público e as universidades. Durante o evento Caminhos do Brasil, especialistas do Ministério da Ciência e Tecnologia, empresas de tecnologia e universidades como a PUC-Rio defenderam a criação de trilhas formativas voltadas à IA, com foco em aplicações práticas, estágios conjuntos e projetos colaborativos.

Exemplo desse esforço é o programa TIC em Trilhas ECOA, oferecido pelo TI Rio em parceria com a PUC-Rio. A formação, gratuita e online, é dividida em quatro trilhas voltadas às demandas reais do setor: Produtividade na Era da IA, Soluções Low-Code, Visualização e Inteligência de Dados e Da Ideia ao Produto Digital. A proposta é clara: formar profissionais capazes de atuar diretamente nos setores mais carentes de qualificação e mais promissores da economia digital.
Apesar do avanço, os desafios persistem. A assimetria entre grandes corporações e pequenas empresas, a baixa digitalização estrutural e a falta de políticas públicas robustas para inovação ainda limitam o crescimento do ecossistema nacional de IA. Muitos analistas apontam que, para superar essas barreiras, será necessário estabelecer modelos de governança colaborativa, com regras claras sobre propriedade intelectual, proteção de dados e divisão de responsabilidades entre parceiros.
Ainda assim, o movimento é otimista. A democratização das ferramentas de IA, muitas delas baseadas em plataformas acessíveis, tem permitido que pequenas e médias empresas comecem a explorar o potencial da tecnologia, mesmo que em ritmo mais lento. A velocidade, porém, é fator decisivo.

Como aponta o relatório da Bain & Company, a IA deixou de ser um diferencial e passou a ser um imperativo. Aquelas empresas que conseguem usá-la de forma estratégica não apenas ganham eficiência, como inovam com mais rapidez, oferecem experiências personalizadas e reduzem custos operacionais de forma significativa.
O futuro da inteligência artificial no Brasil dependerá da capacidade do país de unir setores, acelerar a formação de talentos e manter a tecnologia como prioridade nacional. E diante de um cenário global cada vez mais competitivo, correr em grupo pode ser a única forma de cruzar a linha de chegada.