Elas entram discretamente em reuniões virtuais, registram cada palavra e depois entregam relatórios impecáveis. As ferramentas de inteligência artificial que transcrevem e resumem encontros online já fazem parte da rotina de milhões de pessoas em todo o mundo. Agora, uma delas está no centro de uma tempestade judicial. A Otter . ai , uma das líderes do setor, tornou-se o primeiro agente de inteligência artificial processado coletivamente nos Estados Unidos. A acusação: gravar conversas confidenciais em plataformas como Zoom, Google Meet e Microsoft Teams sem o consentimento dos participantes.
De acordo com documentos apresentados no Tribunal Distrital do Norte da Califórnia, a empresa teria não apenas registrado reuniões de forma sorrateira, sem autorização explícita, como também utilizado esse material para aprimorar seus modelos de reconhecimento de fala e machine learning.
O problema é que, ao coletar informações em encontros que vão de conversas empresariais a negociações sensíveis, o sistema coloca em risco a confidencialidade de milhões de usuários.
A dimensão do impacto é clara. Segundo dados da própria Otter, mais de 25 milhões de pessoas já utilizaram a plataforma, que processou mais de 1 bilhão de reuniões.
A defesa da companhia sustenta que os dados seriam anonimizados antes de serem utilizados. Mas especialistas em privacidade argumentam que a anonimização não elimina os riscos. Conversas sigilosas, ainda que despersonalizadas, podem conter informações estratégicas ou pessoais capazes de comprometer empresas ou indivíduos.
O caso ganhou repercussão justamente porque, em situações concretas, transcrições geradas pela ferramenta acabaram expondo detalhes de reuniões privadas. Em um episódio ocorrido em outubro de 2024, relatado pela eWeek, um resumo automatizado teria até interferido em um acordo milionário ao revelar informações que deveriam ter permanecido restritas.
Mais do que uma questão de imagem para a Otter . ai , a ação coletiva pode se tornar um marco regulatório para todo o ecossistema de IAs voltadas para reuniões virtuais.
Se a Justiça entender que houve violação de privacidade, outras startups que oferecem serviços semelhantes, como Tl;dv, Fireflies, Read. ai e Fathom, podem ser impactadas.
O processo ainda está em andamento, mas já serve de alerta: a mesma tecnologia que promete ganhos de produtividade também pode estar colocando em xeque a confidencialidade de conversas que movem empresas, governos e negócios em escala global.
Texto: Redação TI Rio