
A Autoridade Monetária de Singapura (MAS) divulgou um novo documento de consulta propondo diretrizes para orientar instituições financeiras na gestão responsável dos riscos associados ao uso de Inteligência Artificial. A iniciativa consolida o esforço do país para desenvolver um arcabouço regulatório preditivo, claro e alinhado ao avanço tecnológico, especialmente em aplicações que já fazem parte do cotidiano do setor financeiro.
As diretrizes delineadas pela MAS estabelecem expectativas de supervisão sobre como bancos, seguradoras e demais instituições devem supervisionar, controlar e desenvolver capacidades internas relacionadas ao uso de IA. O objetivo é oferecer uma estrutura comum e flexível, proporcional à escala e à complexidade tecnológica de cada instituição, abrangendo desde sistemas baseados em aprendizado de máquina até aplicações emergentes, como IA generativa e agentes autônomos.
O documento organiza suas propostas em três eixos principais. O primeiro trata de governança e supervisão: conselhos e alta administração devem ter papel central na definição de políticas, processos e cultura institucional voltados ao uso responsável da IA. O segundo eixo aborda os sistemas, políticas e procedimentos internos de gestão de risco, recomendando que as instituições mantenham inventários atualizados de sistemas de IA, identifiquem suas aplicações e avaliem a materialidade dos riscos com base em impacto, dependência e complexidade. O terceiro eixo orienta o estabelecimento de controles ao longo de todo o ciclo de vida da IA, incluindo governança de dados, mitigação de vieses, transparência, explicabilidade, supervisão humana, gestão de terceiros e processos de atualização tecnológica.
As propostas se apoiam em uma revisão realizada pela MAS, em 2024, sobre o uso de IA nos principais bancos de Singapura, além de contribuições colhidas junto a instituições de todo o ecossistema financeiro. O vice-diretor administrativo da MAS, Ho Hern Shin, afirmou que o novo conjunto de diretrizes “fornece expectativas claras para apoiar as instituições financeiras no aproveitamento da IA em suas operações”, reforçando a busca por uma abordagem baseada em risco e alinhada à inovação responsável.
A iniciativa de Singapura reflete uma tendência crescente no cenário internacional: a construção de frameworks regulatórios capazes de acompanhar a evolução das tecnologias de IA de forma mais próxima, detalhada e preditiva. No caso singapuriano, essa orientação se traduz em mecanismos que combinam supervisão contínua, inventário tecnológico e clareza de responsabilidade.
O que Singapura fez de novo?
- Criou um framework específico e completo para IA no sistema financeiro:
– Não é genérico; é uma norma dedicada só à IA. - Exige inventários obrigatórios de todos os sistemas de IA usados por bancos:
– Mapeamento, classificação e avaliação de risco modelo a modelo. - Coloca o conselho e a alta administração como responsáveis diretos pela IA:
– Governança de IA vira tema de diretoria, não só técnico. - Estabelece controles obrigatórios em todo o ciclo de vida da IA:
– Dados, vieses, explicabilidade, auditoria, supervisão humana, gestão de terceiros e mudanças. - Cria um modelo proporcional ao risco:
– Quanto maior o impacto do sistema, maior o rigor regulatório. - Inclui IA generativa e agentes autônomos na regulamentação:
– Já incorpora tecnologias emergentes.
E como funciona no Brasil?
No Brasil, o tema da Inteligência Artificial no setor financeiro é tratado por diferentes órgãos reguladores, cada um a partir de suas competências específicas. O Banco Central do Brasil atua principalmente por meio das normas de gestão de risco operacional, governança e segurança cibernética – arcabouço que também orienta o Open Finance. A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) regula o uso de IA em plataformas de investimento, com foco em transparência de sistemas automatizados, mitigação de vieses e deveres fiduciários. Já a ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados) supervisiona aspectos ligados ao tratamento de dados pessoais, privacidade, responsabilidade e direitos dos titulares em aplicações que utilizam IA.
Diferentemente do modelo singapuriano, que consolida suas orientações em um único framework voltado especificamente ao uso de IA no setor financeiro, o Brasil opera com um conjunto de normas distribuídas, que se conectam ao tema por meio de princípios mais amplos como governança, segurança, transparência e responsabilidade. Na prática, as instituições financeiras utilizam essas referências para estruturar seus processos internos, enquanto acompanham a evolução do debate legislativo sobre Inteligência Artificial no país.
Nesse cenário, a iniciativa da MAS representa um exemplo de abordagem integrada e preditiva, oferecendo um parâmetro sobre como diferentes jurisdições podem organizar suas políticas de IA de maneira alinhada à inovação tecnológica e à supervisão contínua.
Texto: Redação TI Rio