Com visões distintas, bloco dos emergentes e União Europeia lançam propostas que moldam o futuro da inteligência artificial no mundo
Na esteira da rápida expansão da inteligência artificial (IA) em todos os setores da sociedade, o debate sobre quem controla, regula e se beneficia dessas tecnologias ganhou força com duas importantes iniciativas internacionais divulgadas nesta semana: a declaração conjunta do BRICS sobre IA de código aberto, durante a 17ª Cúpula do grupo realizada no Rio de Janeiro, e o projeto de código de conduta voluntário apresentado pela União Europeia para orientar o cumprimento do seu já aprovado AI Act.
Enquanto o BRICS propõe um modelo de cooperação multilateral, com foco na inclusão dos países em desenvolvimento e no uso de tecnologias abertas, a Europa avança em um caminho de regulação rígida, centrado na transparência, proteção de direitos autorais e mitigação de riscos sistêmicos.
BRICS: IA aberta, inclusiva e sob a ONU
Em 6 de julho, os líderes dos países membros do BRICS divulgaram um documento defendendo o desenvolvimento de IA em código aberto, como forma de democratizar o acesso a essas tecnologias. A proposta inclui o compartilhamento global de conhecimentos e ferramentas e a criação de um sistema de governança da IA sob a égide da ONU, que garantiria a participação dos países do Sul Global em um debate hoje dominado por nações ricas e grandes corporações de tecnologia.
A declaração também chama atenção para os desafios éticos e sociais gerados pela IA, como os viéses algorítmicos que afetam grupos historicamente vulneráveis (mulheres, minorias, pessoas com deficiência), e os riscos da manipulação política e informacional por meio de deepfakes e conteúdos gerados por IA. Como resposta, o bloco sugere:
- Investimento em educação midiática
- Criação de ferramentas de detecção de desinformação
- Estabelecimento de padrões éticos construídos por meio de cooperação interdisciplinar
Outro ponto central foi o apelo por equilíbrio entre inovação e proteção da propriedade intelectual. O BRICS alerta para o uso crescente de obras protegidas por copyright em treinamentos de IA sem autorização, e propõe salvaguardas que preservem os direitos de autores e artistas, sem bloquear o avanço tecnológico.
Para os líderes do bloco, o modelo aberto e colaborativo é o único caminho viável para que a IA não amplie ainda mais as desigualdades globais, mas sim contribua com a soberania tecnológica, desenvolvimento sustentável e justiça social.
União Europeia: transparência, copyright e segurança jurídica
Já no dia 10 de julho, a Comissão Europeia apresentou um código de conduta voluntário como etapa intermediária para a implementação completa do AI Act, que entrará em vigor gradualmente até 2027. A proposta, voltada a grandes desenvolvedores de IA (como OpenAI, Meta, Google e Anthropic), tem como objetivo antecipar boas práticas de conformidade e reduzir os riscos associados à aplicação de IA em larga escala.
O código propõe que essas empresas:
- Divulguem sumários públicos sobre os dados usados no treinamento de seus modelos
- Utilizem conteúdos protegidos por copyright apenas dentro dos limites legais
- Estabeleçam mecanismos internos para identificar e mitigar riscos sistêmicos, como discriminação algorítmica, vazamento de dados sensíveis e desinformação automatizada
A adesão ao código, embora voluntária, é apresentada como uma vantagem para as empresas que desejam manter segurança jurídica no ambiente regulatório europeu. Quem não aderir poderá enfrentar obrigações legais mais severas a partir da vigência do AI Act – cujas primeiras exigências passam a valer em 2 de agosto de 2025.
Duas abordagens, um mesmo desafio
Apesar das diferenças de tom e estratégia, tanto o BRICS quanto a União Europeia convergem em reconhecer que a IA transformará profundamente a economia, o trabalho, a política e as relações sociais nas próximas décadas. O dilema é como controlar seus riscos sem frear o potencial de inovação.
De um lado, o BRICS aposta na cooperação multilateral e no acesso aberto como motores de desenvolvimento inclusivo. De outro, a UE avança com regulação robusta para conter abusos e garantir direitos fundamentais, especialmente no uso comercial da tecnologia. As iniciativas refletem também uma disputa geopolítica em torno da liderança global na era da inteligência artificial.
Texto: Redação TI Rio