Consultor do TI Rio diz que LGPD exigirá novas condutas de veículos e profissionais da comunicação com necessidade de se preparar desde já

A entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) em agosto do próximo ano vai obrigar os profissionais de comunicação a reverem grande parte de seus procedimentos. Veículos de imprensa e assessorias deverão adotar uma série de precauções e entenderem novos conceitos. Por exemplo, saber quando o jornalista deve ter o consentimento da fonte para publicação de um texto ou quando pode recorrer ao princípio do “legítimo interesse” para divulgá-lo sem obter o consentimento. Ou, ainda, a diferença entre “privacidade” e “intimidade”.

O advogado Gilberto de Almeida, consultor do TI Rio (Sindicato das Empresas de Informática) e da ONU sobre leis para a Internet, em palestra realizada nesta quarta-feira na Associação Brasileira de Imprensa (ABI) explicou alguns dos principais pontos da lei.

Segundo Gilberto de Almeida, o bom senso deverá prevalecer, mas algumas providências devem ser tomadas desde já. Entre elas estão aproveitar o tempo até agosto de 2020 para introduzir boas práticas de governança. Uma sugestão é que as associações de classe e federações criem códigos de conduta que possam ser adotados pelo conjunto dos profissionais, seja de comunicação ou qualquer outro setor. “Há tempo para tomar as precauções e sistematizar as orientações. Coletivamente fica mais fácil. Podem ser harmonizadas a arquitetura de políticas corporativas e de contratos num determinado ecossistema. Assim como a preparação jurídica e a técnica (de TI) devem andar sempre juntas. É bom lembrar que há diversas rotas internas possíveis, via TI, SI, compliance etc. O importante é integrar as determinações da LGPD ao sistema regulatório do setor em pauta.”, afirma.

Privacidade x Intimidade – Os jornalistas, diz Gilberto Almeida, deverão “calibrar” o interesse por dados pessoais ao tipo de matéria que estiverem redigindo. Qualquer exposição de informações que extrapole o contexto abordado poderá ser questionada. Dessa forma, deverá, por exemplo, “esterilizar” dados pessoais mediante estatísticas em investigações. Assim como “anonimizar” ou “pseudominizar” personagens em suas matérias. “Sempre que for uma informação sem relevância para o contexto, o dado que pode identificar o personagem deve ser omitido. Pode digitar um “xxxx”, criar um apelido, publicar iniciais, qualquer solução que preserve a pessoa.” É responsabilidade do jornalista, diz, proteger a segurança dos dados pessoais incluídos nas matérias. Assim como também o profissional deve exigir a proteção de seus próprios dados pessoais contra possíveis intimidações ou censura.

É dever do jornalista também discernir entre os conceitos de “privacidade” e o de “intimidade”. Para explicar a diferença, Gilberto exemplificou: “Se uma pessoa estiver num estádio de futebol, sua imagem – como a de milhares de outras pessoas – for exibida no telão e ele reivindicar direito à privacidade, não ganhará. Mas, vamos supor, na hora ele está com o dedo no nariz e a imagem é exibida. Ele ganhará por ter tido sua intimidade exposta.”

Outra preocupação que deve pautar a atividade jornalística é evitar que informações no campo do georreferenciamento permitam “driblar” a esterilização dos dados e levem à identificação dos personagens.

Algumas outras medidas em que os veículos de comunicação devem estar atentos com relação à LGPD são a de não publicar suítes de matérias com dados pessoais, não republicar textos antigos que voltem a expor personagens, não utilizar entrevistas concedidas para um veículo em outro com diferente perfil sem a autorização do entrevistado; evitar discriminação odiosa baseada em perfil de usuários em redes sociais. Ao mesmo tempo, a empresa deve publicar e deixar disponível sua política de proteção de dados pessoais, assim como estabelecer contratos com empresas de TI, seus empregados e clientes de forma que inclua cláusulas protetivas. Outro conselho de Gilberto Almeida é a elaboração de relatório de impacto de proteção de dados pessoais.

Alerta às assessorias – Às assessorias também cabem restrições, como a necessidade de adequar mailings e listas de distribuições de forma a proteger os dados neles contidos e assegurar que só serão utilizados dentro dos parâmetros previamente consentidos. Gilberto Almeida explicou que o mailing é uma propriedade e responsabilidade de quem o estruturou, para certo fim, e que esse não pode livremente repassar a terceiros. “Mais uma vez prevalece o bom senso. Ceder um, dois, três nomes de um mailing de uma empresa ou uma pessoa para outra, não gera problema. Esse só ocorrerá se for repassada uma listagem completa”

Gilberto diz que as assessorias devem estar atentas para que dados de seus clientes não sejam citados indevidamente, assim como devem se policiar para não usarem dados pessoais de seus clientes além do necessário para a finalidade da divulgação feita. Orienta também a não comprarem ou venderem mailings sem autorização ou legitimação. As assessorias, diz, devem selecionar os meios de comunicação compatíveis com a divulgação em pauta. Devem também atentar à temporalidade e espacialidade do interesse da notícia e, sempre que necessário, exigir a atualização, retificação ou remoção de dados expostos irregularmente. Na relação com os clientes, devem estabelecer em contrato toda a estratégia que pretende adotar na divulgação.

A LGPD, explica Gilberto, reúne um pouco de várias outras leis em vigor, como o código civil, e tem problemas em sua estruturação. Em sua aplicação ao jornalismo acaba recorrendo a um artigo (4o) onde remete à interpretação dizendo que a lei não se aplica a tratamento de dados pessoais “realizado para fins exclusivamente jornalístico e artístico”, deixando de esclarecer o conceito do “exclusivamente” e se considera como jornalismo os blogs e outros canais noticiosos informais.

O seminário “Impactos, riscos e oportunidades da LGPD para profissionais e empresas de comunicação” foi realizado em uma parceria entre o TI Rio, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro e a ABI. O presidente do TI Rio, Benito Paret, disse que a aproximação da entrada em vigor da lei evidencia as incertezas acerca de sua vigência. Afirmou que os pequenos negócios não têm as mesmas estruturas dos grandes e podem vir a ser penalizados. Paulo Jerônimo (Pagê), presidente da ABI, assegurou que a entidade vai se esforçar para apoiar os profissionais da comunicação para as necessárias adequações e Beth Costa, diretora do SJPMRJ, afirmou que a entidade estudará a possibilidade de editar um código de conduta, preferencialmente em parceria com a Fenaj, para orientação aos profissionais.

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