
Durante a abertura do BlockchainGov 2025, realizada em Brasília no dia 26 de novembro, o governo federal voltou a enfatizar o papel da tecnologia blockchain na construção da nova Carteira de Identidade Nacional (CIN), um dos maiores projetos atuais de transformação digital da administração pública. O encontro reuniu representantes do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), Tribunal de Contas da União (TCU), BNDES e especialistas da Rede Blockchain Brasil.
A CIN já alcança cerca de 40 milhões de brasileiros, mas, apesar do avanço, o governo reforçou que o uso do blockchain na gestão de identidades ainda está em fase de teste, evolução e validação contínua, especialmente porque se trata de uma tecnologia complexa aplicada a uma base nacional de dados inédita em escala.
Blockchain como infraestrutura da identificação civil
Segundo o secretário de Governo Digital, Rogério Mascarenhas, a adoção da tecnologia é um marco de cidadania e interoperabilidade. Ele destacou no evento que a nova carteira é “baseada em tecnologia blockchain” e representa o potencial de uma parceria efetiva entre estados e União.
Na prática, a solução – desenvolvida pelo Serpro – utiliza blockchain no Cadastro Compartilhado da Receita Federal, permitindo que dados sejam consultados, validados e atualizados de forma unificada pelos Órgãos de Identificação Civil (OICs). Essa camada distribuída reduz risco de inconsistências, impede duplicidade de documentos e reforça rastreabilidade e segurança.
Apesar disso, especialistas presentes no evento lembraram que a operacionalização plena de uma infraestrutura nacional em blockchain ainda requer testes contínuos, ajustes regulatórios e sobretudo verificação de desempenho em cenários reais de alto volume.
Por que blockchain?
O governo aponta quatro razões centrais para a adoção dessa arquitetura:
- Imutabilidade – Cada transação registrada (como emissão, consulta ou alteração de dados) fica registrada de forma permanente.
- Rastreabilidade – O histórico de operações pode ser auditado, aumentando transparência.
- Descentralização da confiança – Estados, União e OICs podem compartilhar uma camada comum sem depender de um único banco de dados central.
- Segurança de dados – Reduz riscos de fraudes como documentos duplicados, adulteração de registros e inconsistências estaduais.
Mas, ao mesmo tempo, o governo admite que o uso de blockchain para identificação civil não é trivial. Países que avançaram nesse campo, como Estônia e Singapura, demoraram anos até chegar a modelos robustos. No Brasil, o desafio é amplificado pelo tamanho da população, pela heterogeneidade dos sistemas estaduais e pela necessidade de que o blockchain conviva com bases de dados tradicionais já existentes.
Infraestrutura Pública Digital e impacto para serviços públicos
A CIN é o pilar da futura Infraestrutura Pública Digital (IPD) de Identificação Civil, que pretende padronizar a identificação de cidadãos em políticas públicas, benefícios sociais e acesso a serviços digitais.
Essa integração permitirá:
- Reduzir cadastros redundantes entre diferentes órgãos.
- Simplificar o acesso a serviços federais, estaduais e municipais.
- Ampliar a efetividade de programas sociais que dependem de validação de identidade.
- Aumentar a confiabilidade das bases de dados do Estado.
Mais de 171 milhões de brasileiros já utilizam a conta GOV.BR , e a CIN digital – disponível pelo aplicativo – adiciona uma camada a mais de segurança, permitindo que o cidadão eleve sua conta ao nível Ouro, o mais seguro da plataforma.
Avanço importante, mas com desafios tecnológicos
A diretora de Pessoas, TI e Operações do BNDES, Helena Tenorio, ressaltou que uma identidade única é fundamental para um país continental como o Brasil – mas isso exige infraestrutura madura, interoperável e auditável.
O secretário de TI do TCU, Rainério Leite, enfatizou que a identidade única permite destravar uma série de serviços que hoje são complexos ou impossíveis por falta de integração entre bases civis.
Ao longo do evento, pesquisadores e gestores também mencionaram que, embora blockchain seja uma das tecnologias mais promissoras para esse tipo de sistema, a etapa atual ainda é de consolidação, medição de performance e testes de escalabilidade. É necessário garantir que:
- o modelo seja eficiente sob carga real,
- os estados consigam operar a tecnologia de forma uniforme,
- a arquitetura seja economicamente sustentável a longo prazo,
- o cidadão entenda e confie no novo sistema.
Base de Dados do Brasil: o próximo passo
Outro tema discutido foi a Infraestrutura Nacional de Dados (IND), apelidada de “Base de Dados do Brasil”. Trata-se de um ecossistema previsto no Decreto nº 12.198/2024 que busca integrar, qualificar e proteger dados públicos.
A CIN, apoiada por blockchain, é um dos primeiros sistemas a ser integrado a essa infraestrutura.
A secretaria adjunta de Governo Digital, Luanna Roncaratti, destacou que “não basta ter dados; é preciso construir toda uma arquitetura ao redor deles”. Segundo ela, a IND será a espinha dorsal dos serviços públicos inteligentes.
Texto: Redação TI Rio